A China está recorrendo massivamente à soja brasileira para garantir seu abastecimento, importando volumes recordes em meio a um cenário de incertezas comerciais com os Estados Unidos. Uma safra excepcional no Brasil tem sido fundamental para atender a essa demanda crescente, consolidando o país sul-americano como o principal parceiro de Pequim no setor.
Importações Chinesas Atingem Níveis Recordes
A China, segundo maior consumidor mundial de soja, deve importar um volume impressionante de $112
milhões de toneladas do grão no ano-safra de 2025 a 2026, de acordo com a agência Reuters. A análise de dados alfandegários revela uma tendência de alta contínua: julho marcou o segundo mês consecutivo de importações mensais recordes, com a China adquirindo $11,67
milhões de toneladas. Esse número representa um aumento de $18,5\%
em relação a julho do ano anterior e supera significativamente a previsão de $10,48
milhões de toneladas. O mês de junho seguiu a mesma linha, com as importações chinesas crescendo $10\%
em comparação com o mesmo período de 2024, totalizando $12,26
milhões de toneladas.
Brasil se Consolida como Principal Fornecedor
Esses volumes de compra expressivos só são possíveis graças a uma safra abundante no Brasil. Sendo o maior exportador mundial de soja, o Brasil vendeu $16,9
milhões de toneladas do grão para a China apenas no primeiro trimestre de 2025, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. O volume representa um aumento de quase $7\%
em comparação com os $15,8
milhões de toneladas exportadas no mesmo período de 2024. As projeções do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) indicam que a safra de soja 2025-26 no Brasil deve atingir $176
milhões de toneladas, um aumento de cerca de $2\%
.
Incertezas Comerciais com os EUA Impulsionam Compras
Analistas de mercado apontam que a forte procura chinesa está diretamente ligada às tensões comerciais com os Estados Unidos. Rosa Wang, analista da consultoria de agronegócios JCI, com sede em Xangai, afirmou à Reuters que as importações robustas sugerem que o mercado chinês está “se preparando para potenciais incertezas” no comércio com os EUA, seu segundo maior fornecedor. Ela prevê que as importações permanecerão acima de $10
milhões de toneladas em agosto e setembro, com a maior parte desse volume vindo do Brasil. Wan Chengzhi, analista da Capital Jingdu Futures, complementa, explicando que a grande safra brasileira permitirá que a oferta se mantenha em níveis elevados até o quarto trimestre, por mais tempo do que em anos anteriores. Atualmente, a China ainda não realizou nenhuma compra de soja americana para entrega no quarto trimestre, enquanto os compradores aguardam os desdobramentos da guerra comercial iniciada pelo presidente dos EUA, Donald Trump.
Exportadores Americanos Enfrentam Perdas Bilionárias
Como resultado direto desse cenário, os exportadores de soja dos EUA correm o risco de perder bilhões de dólares em vendas para a China este ano. Com as negociações comerciais se arrastando, os importadores chineses já garantiram seus carregamentos do Brasil para o período que tradicionalmente pertence ao mercado americano. De acordo com fontes do mercado, os compradores chineses já fecharam a compra de cerca de $8
milhões de toneladas para entrega em setembro, todas provenientes da América do Sul. Para outubro, já foram assegurados aproximadamente $4
milhões de toneladas, metade da necessidade esperada, também com origem sul-americana. “As fortes compras de soja pela China no terceiro trimestre sugerem que a indústria acumulou estoques antes de possíveis riscos de abastecimento no quarto trimestre”, disse Wang Wenshen, analista da Sublime China Information. Para efeito de comparação, no ano passado, os importadores chineses compraram cerca de `7 milhões de toneladas dos EUA para embarque durante esses dois meses.
Perspectivas para o Final do Ano e o Futuro do Mercado
A ausência prolongada de compras chinesas para a safra americana, que começa em setembro, pode pressionar ainda mais os contratos futuros de Chicago, que já operam perto de seus menores valores em cinco anos. Normalmente, a maior parte das compras chinesas de soja americana ocorre entre setembro e janeiro, antes que a safra brasileira domine o mercado.
Ainda que exista uma pequena janela para vendas americanas no final de 2025 ou início de 2026, os volumes provavelmente serão limitados se as tarifas comerciais forem mantidas. “O consenso é que o Brasil não terá soja suficiente, no final das contas, para satisfazer todas as necessidades de importação da China”, avalia Terry Reilly, estrategista agrícola sênior da Marex. “Haverá um déficit no final da temporada. Com base no ano-safra brasileiro, esse déficit pode ser de dois a cinco milhões de toneladas”.
Essa dinâmica reflete uma estratégia de longo prazo da China, que vem reduzindo sua dependência de produtos agrícolas dos EUA desde a guerra comercial iniciada durante o primeiro mandato do presidente Donald Trump. No ano passado, a China importou aproximadamente $105
milhões de toneladas de soja. Desse total, $22,13
milhões de toneladas vieram dos EUA, um negócio avaliado em $12
bilhões.